terça-feira, abril 29, 2003

GatosAi o malvado do gato... onde é que eu pus a fisga?...
“Há milhares de anos os gatos eram adorados como deuses. Nunca se esqueceram disso.”
As coisas podem tornar-se tão fascinantes tanto mais quanto antes nunca tínhamos reparado nelas. O caso dos gatos é paradigmático. Toda esta vida foi mais com desconfiança que respeito que olhei sempre de lado para os gatos. Havia neles um misto de medo, aquela miufa ridícula e histérica que os gatos parecem ter, e uma arrogância no miar aliada a uma indisciplina provocadora que despoletavam em mim um desejo confortável e incontrolavel de fazer-lhes pontaria com a fisga armada, era eu petiz.
“Os cães vêm quando chamas por eles. Os gatos tomam nota do que dizes e, eventualmente, voltarão ao assunto.” Mary Bly
Apesar disso o sentimento acompanhou-me, confesso, mesmo depois de criança, já adulto, mesmo depois de ter adquirido em Córdoba uma fisga árabe. Até um dia, um dia de partida e de regresso, daqueles dias em que só se deve levar ou trazer, como era o caso, o que se tinha levado, o essencial. Não um, mas dois gatos escolheram-me e fizeram comigo 3000 quilómetros.
"Nos olhos de um gato podes observar o tempo, na verdade, a eternidade!” Charles Baudelaire
A distancia não significa nada. Os sentimentos podem desvanecer-se ou exaltarem-se em poucos metros. Mas quando se viaja com determinado tipo de bagagem extra, cada quilometro conta. Em cada viagem deixamos sempre algo para trás, nem sempre o irremediável, muitas vezes o inconfessável. Mas nesta viagem, o que ficou para trás foi aquele sentimento, o da fisga, o da criança cruelzinha para com os gatos.
“Deus fez o gato para que o homem pudesse ter o privilégio de acariciar o leão.” Fernand Mery
Os gatos sabem melhor que ninguém que crueldade pode haver numa criança. Os meus aprenderam depressa essa lição. Uma pessoa amiga levou uma vez lá a casa o filho, criança que mal sabia gatinhar mas que já tinha força suficiente para agarrar pelos rabo e não mais largar os meus gatos, na altura jovens de 5 ou 6 meses.
“Mesmo o mais pequeno dos gatos é uma obra de arte”. Leonardo da Vinci
Entre o constrangimento de controlar a vontade de dar dois tabefes na criancinha e a passividade dos paizinhos indiferentes, lá assisti de pés e mãos atadas. A criancinha lá se divertiu e saiu ilesa do acontecimento.
“O gato pode servir-nos de modelo em questões de higiene e como criar filhos”. Arthur Marx
Aquele pequeno episódio fez-me lembrar aqueles fulanos que na rua parecem pessoas vulgares e na porrada se for preciso comportam-se dessa maneira apesar do cinturão preto que trazem por debaixo das calças. Não querem fazer uso das suas capacidades pois imediatamente ficariam numa situação de superioridade em relação á outra pessoa; ou seja, seriam capazes de partir os cornos á outra pessoa ou simplesmente paraliza-la de medo com um simples grito e isso é algo que é muito bom saber guardar só para si em alturas de aperto, manter o sangue frio e o sorriso displicente. Coisas que muitas vezes acabam por ser dissuadoras do confronto físico porque se cria no oponente uma sensação de ‘aqui há gato’ perturbadora.
“Há duas maneira de escapar às misérias da vida: Música e gatos.” Albert Schweizer
Assim se comportaram os meus gatos naquele dia. Por debaixo daquele miarzinho, daqueles olhinhos grandes, redondos e brilhantes, daquele pelo lustroso, aqueles gatinhos estavam conscientes que eram autênticas feras, possuidores de garras afiadissimas capazes de certamente estraçalhar a criancinha, na altura pouco maior que um coelho anão.
“Quem consegue acreditar que não há alma por detrás daqueles olhos luminosos.” Theophile Gautier
Eles lá a aturaram, com a tal calma e sangue frio dos autêntico cinturões negros vestidos á paisana, mas juraram para nunca mais. Cada vez que se aproxima alguém deles com menos de meio metro, é vê-los porem-se a milhas!
“Porquê procurar consolo no Islão, Budismo ou Catolicismo – um gato dá-te o mesmo, e ainda te aquece o colo”. Charles Darwin
- Aquela barata ali em baixo faz-me lembrar o JoaquimAnedota de elite
- O Joaquim do Poço é um filho da p*ta!!!
- Minha filha não digas isso. Não vês que todos somos irmãos, filhos do Senhor. O que dizes é muito feio!
- Mas é verdade, ele é mesmo um filho da p*ta!! O que se há-de fazer... Ele não deve ter culpa de ser assim. Certamente foram as condicionantes da vida que o levaram a ser o que é. Terá sido ele próprio vitima dum outro ou outra filha da p*ta qualquer. Depois verifica-se aquilo a que se chama o efeito dominó.
- Mas o que ele te fez minha filha, aproxima-te mais um bocadinho e conta aqui ao Senhor Prior.
- Há uma semana, ele apanhou-me ali atrás da Junta e começou-me a mexer nas maminhas, um filho da p*ta daqueles!
- Mas minha filha, jovem e roliça adolescente, isso também não é razão para agora dizeres que o moço é filho da p*ta. Mexeu-te assim ?... Eu também mexo e não sou filho da p*ta pois não minha filha ?
- Não Senhor Prior. Mas ele depois despiu-me e começou-me a tocar em baixo. Fez-me coisas com a língua... Parecia que tinha vida própria.
- Fez assim como eu estou a fazer não fez minha filha ? E eu não sou filho da p*ta pois não ?
- Não senhor Prior. Mas ele depois deitou-me e penetrou-me, o filho da p*ta.
- Mas minha filha, fez-te assim ? Vê que eu também o faço e não sou nenhum filho da p*ta pois não ?
- Não Senhor Prior, ele é que é um grande filho da p*ta porque depois do serviço feito disse-me que tinha sida!
- Ah grande filho da p*ta!!!!

Versão original: Faísca
Versão adulterada/publicada: jorgexistence

quinta-feira, abril 24, 2003

Relva nao que me faz mal a peleFigo
Há muito tempo que não via uma boa jogatana de bola. Aconteceu ontem. No entanto já não vejo a bola como antigamente. Ela lá continua, redonda. Os jogadores é que me parecem cada vez mais quadrados ou melhor, rectangulares. Não consigo deixar de imaginar no écran 22 maços de notas atrás duma bola. E não consigo deixar de notar na falta de alegria com que se joga. O Figo é escandaloso. Se eu fosse treinador do Real rifava-o. O mister não foi tão longe e decidiu substituí-lo a meio da 2ª parte, merecido! Já nem sequer falo em prazer, no prazer de jogar á bola. O homem até pode não ter prazer nenhum em jogar á bola e a alegria essa venha do ganhar á bola. A ganhar um milhão de contos que mais milhão menos milhão ganha por ano, ao menos que disfarce um bocadinho. Não custa nada, há cursos no chapitô ou no C.E.M. O gajo que se informe. É sabido que a bolsa está em baixo, que todos temos os nossos dias mas o estilo Figo em campo é cada vez mais aquele visível frete que o número 10 parece estar sempre a fazer. E vai daí, uma sarrafada no que tem mais pernas. Amarelo, antes da substituição, merecido! Acho que se ganhasse por ano um milhão de qualquer coisa que desse para comprar uma penthouse no Mónaco e outra em novaiorque, só não pareceria o passarinho mais feliz do mundo a esvoaçar por todo o lado porque andava sempre vestido ‘hugo boss’ (é sabido que os passarinhos não vestem roupa de marca). Agora o Figo, é daqueles casos em que obrigatoriamente tinha que comer a relva. Tivesse eu no lugar dele, coisa que juro nem que me pagassem, nem eu me sentia bem se assim não fosse. Haveria de saber de cor o sabor das relvas de cada estádio e durante o jogo, aproveitava enquanto o arbitro não via, para palitar os dentes... com palitos Guess, claro!
Fiquei viciado estava eu ainda na barriga da minha mãe!Ende de oscar gous tu...
Oscar para o maior desperdício de gasolina: Volkswagen, meio televisão, produto Polo. Sinopse do spot: Um casalinho, ela grávida e com um desejo irreprimível de comer um gelado bem servido, ele um rapaz normal como tantos outros. Como o ‘ti-pichas’ já morreu, (nome do homenzinho que montado numa motoreta concebida para o efeito, vendia gelados/sorvetes de terra em terra, inclusive aquela onde nasci; a origem do peculiar nome ainda é hoje um mistério para a minha geração) não há nenhuma ‘Primetime’ por perto, á Hagen Dasz só vale a pena ir quando nos mandam um vale por altura do nosso aniversário, ela é alérgica aos gelados da ‘Olá’ e ainda não fazem entregas de gelados ao domicilio, toca a pegar no Polo, um carro especialmente concebido para situações semelhantes, e ir por aí fora. Começa-se pelo Parque das Nações (o casal supostamente residirá ali num daqueles apartamentos com vista para o Barreiro e arredores, oferecido pelos pai dela, pessoas abastadas que terão enriquecido explorando um posto de abastecimento de gasolina na segunda circular). A musica no leitor de CD’s áudio é do mesmo género da que passou numa noite em que tive no Captain Kirk, género que a minha relativa ignorância musical não me deixa identificar.
Começa então a busca pelo gelado pedido, do Parque das Nações para o interior de Lisboa. Um policia sem saber o que fazer á vida mas de bom coração, como o são todos, montado numa BMW, presta-se de imediato a escoltar o Polo, julgando porém, dado o conteúdo do mesmo, que o veículo se dirige em urgência para a maternidade mais próxima... Mas não! Não se faz. O Polo lá continua a sua viagem, desta vez rumo á margem sul. É vê-lo passar a ponte. Não se ouve aquele barulho característico que se ouve quando se passa a ponte (faixa do meio) porque continua a musica. O ritmo da musica é contagiante e a esta hora começo a interrogar-me quem afinal toca aquilo. Lá dentro do Polo, parece que estou a ouvi-la “querido, arranjas-me a porra dum gelado ou não?”. Não, não há nada de fresco na margem sul. Só prédios de 4 andares sem elevador, esplanadas repletas de desocupados suburbanos e o mesmo transito caótico da cidade. Não admira que o Polo volte á capital, desta vez á Baixa. Haveria ali uma geladaria famosa... Não, afinal era uma casa que fazia bolos rei. Continua o desbaratar de gasolina. O que faz uma mulher grávida com desejos. Até que finalmente, numa daquelas lojas típicas de vender gelados, parece-me que ali para os lados da Rua dos Bacalhoeiros, prepara-se o dono da loja para fechar o gradeamento, que isto a ladroagem o há por toda a parte, quando o marido espavorido chega, ainda a tempo de o vermos depois de gelado na mão. Menos um divórcio, por ora...

quarta-feira, abril 23, 2003

Foto autografada gentilmente sacada de um site qualquer onde se pode comprovar efectivamente a beleza da CarmenTurd fun
Chau olhando para a sanita, falando para matéria fecal (vulgo fez ou cagalhão inteligente, hipotese aventada por Mike) que depois de entalada na sanita da casa de banho da Carmen Electra, aparece no mesmo estado mas na sanita da casa de banho dos 3 ‘guys’, (plano magistral: a Carmen, perdão, a camera está dentro da sanita e o que se vê são as caras dos 3):
“We mean you no harm!”
Imperdível, de antologia. Todos os dias úteis no 2º canal depois do Noddy e antes da Sabrina.
Clique aqui para aprender a montar uma sanita e/ou aqui para ter um wallpaper da Carmen Electra (a cores e com a barriga á mostra)

terça-feira, abril 22, 2003

Icones 1.0
Vejo a actriz Alexandra Lencastre a dançar e a despir-se ao mesmo tempo. Isto não é assim uma habilidade por ali além mas é a prova viva de que, se ainda haviam dúvidas depois da Demi Moore, toda a mulher é uma boa dançarina de striptease em potência.
Se uma boa stripteaser não pode ignorar o público que assiste e ao invés deve até interagir com ele (a assistência urra de agradecimento), uma actriz de cinema ou televisão tem que ignorar completamente a presença da camera de filmar, coisa que a Alexandra não consegue fazer. Está o espétaculo estragado. Lamento mas apesar da unanimidade geral, dos artigos elogiosos vindos de todos os quadrantes, dos convites para filmar do Malkovitch, a realidade é que Alexandra pode ser uma boa stripteaser anónima mas é uma actriz limitada, talvez porque transporta de forma demasiado óbvia a facilidade do ser real e a fachada fácil da sua imagem para as personagens que interpreta. Os grandes actores ficam conhecidos pelas suas grandes interpretações. Ficam as personagens. No caso de Alexandra fica apenas a sua grande beleza, fica-nos sempre só a Alexandra (o que já dá para o gasto), e as personagens que interpreta são apenas o veículo, no caso, para vender televisão ao desbarato. Poderá ser mais um exemplo dum ‘inconveniente de ser bela’, talvez. Talvez quando a vemos representar nos fique a beleza e o resto passe para um menosprezante segundo plano. Mas há actrizes belas que conseguem ser belas actrizes, soberbas e inesquecíveis. Lembro-me de repente de uma ou duas, Uma Thurman em particular. E pode-se ser soberba e inesquecível numa série de ficção portuguesa da TVI ? Claro que não, mas é ali que Alexandra parece estar como peixe na água.
Telever
Inestéticas, velhas, gastas e com má cor... Junte-se uma antena ferrujenta e a abanar com o vento e temos uma má imagem perfeita. Chama-se a isto ver televisão na provincia, onde as coisas, até esta, têm um saborzinho especial. Ver televisão numa 'radiola', começa a ser cada vez mais uma experiência marcante. Procuro agora uma 'korting'.

segunda-feira, abril 14, 2003


Desejo não desejar

Há dias em que uma pessoa sente uma enorme falta de si, e logo deseja o que nem sempre é desejável: Pedir a alguém um pouco de si que lhe empreste, prometendo devolver logo que o desejo passe.

quinta-feira, abril 10, 2003

Vivemos num mundo subaproveitado. Há pessoas subaproveitadas, talentos, tempo (principalmente os minutos), beleza, ideias, espaços subaproveitados a mais. É por isso que apesar do engarrafamento em que se encontra a existência, ainda há muita coisa para acontecer, muita corda para esticar. Consciente disto, tento aproveitar ao máximo, por exemplo a gasolina que está cara, a sombra, o sol, o sinal amarelo, enfim, a generalidade dos recursos naturais, artificiais e existenciais. Em casa tento aproveitar os cantinhos, tenho uma pequena pancada por prateleiras, ou optimização dos espaços (para ser mais técnico) que não quero de maneira nenhuma deixar subaproveitados. E isto é verdade, o meu berbequim é testemunha. Digo que a pancada das prateleiras é pequena porque de vez em quando espreito uma revista de decoração onde tudo me parece grande, genial, muito bem aproveitado.
Um dos cúmulos do subraproveitamento, o Word da Microsoft, o processador de texto mais famoso que o Word Pro da Lotus. Li uma vez que apenas 10% a 15% dos recursos do programa eram utilizados pela maioria dos utilizadores. Um daqueles problemas que julgo não se resolve com mais prateleiras, antes com mais conhecimento ou então arranjando-se motivos para utilizar os outros 85% a 90% do Word subaproveitados. Pior está quem não consegue piratear os 100% do programa e tem que os pagar para só depois gozar uma ínfima parte.
Ao ver um livro de culinária, como todos, portentoso monumento á criatividade e variedade, livro esse que me mostram, pormenor importante, o livro vem até mim e não vice-versa, convém realçar, tenta-me convencer que para fazer aquelas obras de arte bastava uma ida ao supermercado, avental, tacho e colher de pau, e logo a questão do subaproveitamento volta á baila, desta vez intimamente relacionada com a felicidade dos homens. Daquela vasta colecção de livros de culinária que recheiam as prateleiras da maioria das cozinhas, se as leitoras daquela literatura, fizessem nem que fossem 1% das receitas, se as aproveitassem, haveria ementa nova todos os dias e muito semblante se modificaria quando á mesa não se sentisse aquela habitual sensação de ‘deja-vu’.
O Leonard é que sabe
"
If you want a lover
I'll do anything you ask me to
And if you want another kind of love
I'll wear a mask for you
If you want a partner
Take my hand
Or if you want to strike me down in anger
Here I stand
I'm your man

If you want a boxer
I will step into the ring for you
And if you want a doctor
I'll examine every inch of you
If you want a driver
Climb inside
Or if you want to take me for a ride
You know you can
I'm your man

Ah, the moon's too bright
The chain's too tight
The beast won't go to sleep
I've been running through these promises to you
That I made and I could not keep
Ah but a man never got a woman back
Not by begging on his knees
Or I'd crawl to you baby
And I'd fall at your feet
And I'd howl at your beauty
Like a dog in heat
And I'd claw at your heart
And I'd tear at your sheet
I'd say please, please
I'm your man

And if you've got to sleep
A moment on the road
I will steer for you
And if you want to work the street alone
I'll disappear for you
If you want a father for your child
Or only want to walk with me a while
Across the sand
I'm your man

If you want a lover
I'll do anything you ask me to
And if you want another kind of love
I'll wear a mask for you
"
by Leonard Cohen
Ler ou ser lido, eis a obsessão.

quarta-feira, abril 09, 2003

Santa terrinha
Uma pessoa sabe se tem ou não tem terra, quando está na sua suposta terra, a terra onde nasceu, e alguém perdido se aproxima e lhe pergunta onde fica a Rua qualquer coisa. Isto é raro acontecer. As setas proliferam por toda a parte e hoje em dia é raro encontrar-se alguém perdido a não ser na cervejaria ali da esquina ao final do dia. Assim como é raro encontrar-se hoje em dia alguém na sua terra. Há uma atracção e migração natural para outras terras. Mas se acontecer aparecer-nos um tal perdido, e soubermos indicar a localização da rua, será sinal de que “temos terra”. Aquilo corre-nos nas veias, sabemos quem foram aqueles dirigentes associativos e músicos da sociedade filarmónica que deram nome ás ruas, não nos esquecmos deles e sabemos onde ficam as ruas e travessas, quem lá mora ou morou.
Não saber indicar o caminho para a Rua qualquer coisa, nem sequer alguma vez se ter lembrado ouvir semelhante artéria, foi o que aconteceu comigo um dia destes, que na minha terra parei por alguns instantes, o suficiente para se aproximar um perdido e que julgando-me com razão ‘da terra’ me fez a pergunta reveladora. Descobri que não tenho terra. Eu já andava desconfiado. Sentia falta de qualquer coisa só não sabia o que era. Nunca vi o sitio onde nasci como sendo “a minha terra”. Á medida que fui crescendo e ouvia cada vez com mais frequência “vou passar o fim de semana á minha terra” consegui ensaiar um sorriso pré-fabricado que guardava sempre para aquela ocasião, aquela, quando surgia a pergunta “e a tua terra, qual é ?”. Nascer na subúrbia é do caraças e marca-nos para o resto da vida. Ainda há sítios com alguma história ou vizinhas giras, agora o sitio onde nasci, uma correnteza de prédios em forma de ‘S’ mal feito, ao qual se deu o infeliz nome de “Casal de qualquer coisa”... Toda a gente nasce numa aldeia, vila ou cidade... Eu nasci num Casal (!) A história daqueles prédios de três andares, um aglomerado de marquizes inesteticamente coladas umas ás outras no meio daquelas quintas quase abandonadas, escreve-se em duas linhas: Esta terra nasceu porque ali perto surgiu uma grande fábrica e foi rentável construi-la para vender as casas aos trabalhadores que vieram de toda a parte do país com as famílias e pouco mais atrás. Não imagino história mais deprimente para uma terra. Mas torna-se fácil imaginar as escassos quilómetros de distancia as chaminés da fabrica a deitar constantemente aquele fumo negro ou acastanhado nos melhores dias, e a poucos metros o pó e o fumo acumulado nos estores das janelas, resultado de dias e dias de vento sul. Por isso quando há alguns anos deixei aquela ‘santa terrinha’, talvez por isso não me custou nada. Trouxe tudo comigo, a minha infância principalmente, memórias, e os meus amigos, e só lá ficaram as arvores onde faziamos as casas e andavamos de baloiço, os campos onde jogávamos á bola agora cobertos de mato novamente porque parece que já não há putos para jogar á bola, ir á laranja ás escondidas e fugir á frente dos cães do caseiro. Tirado tudo daquela terra onde nasci, só dela me lembro por estes dias porque por ali tenho passado, 60, 80 quilometros à hora, depressa mas o suficiente para reparar que afinal está ali uma placa a indicar a Rua qualquer coisa. Mas só travo lá mais á frente 20 quilómetros á frente, onde já sei indicar ruas e caminhos com muito orgulho.
Cockroach fun
"Estão uma mãe e um filho ciganos a comer azeitonas, vai o filho cigano e diz:
- Mãeinnn, as azeitonas têm pernas mãeinnn ?
- O raio do cigano tá parvo, claro que não!!!!
- Ai mãeinnn, então comi uma barata!"
in Voxx, 91.6fm, 8.Abril.2003 21:57:00

terça-feira, abril 08, 2003

Monge
Um homem de gatas prepara-se para atravessar uma passadeira com o sinal vermelho para peões. Compõe a gravata e calça uns ténis sem marca. Farta-se de se preparar e decide seguir. O condutor que faz uma travagem de 51 cm sai do carro e ajuda o homem de gatas a levantar-se ao mesmo tempo que lhe oferece um sistema informático completo multimédia próprio para homens de gatas mas sem monitor, por uma quantia que na sua boca é irrisória. O homem de gatas aceita mas pergunta-lhe se tem garantia. O condutor vê passar um monge budista na passadeira com sinal verde para peões e pergunta-lhe por gestos se acaso tinha uma garantia que lhe pudesse emprestar. O monge fica confuso pois a única garantia que tem é a da sua morte. Ainda procura por todos os bolsos mas é tempo perdido. Repara então que o sinal entretanto já passou a vermelho e aflito volta para trás. No caminho é atropelado por um carro movido a energia solar e morre por isso, com um sorriso nos lábios.

segunda-feira, abril 07, 2003

Os livros já lidos, já esquecidos ou que nunca foram lembrados começam cada vez mais a sair das estantes já com pó dos alfarrabistas e dos armazéns das editoras, e marcam presença em feiras com dias certos todas as semanas em diversos locais de Lisboa. Visito a Feira do Livro Manuseado, novidade ali na Baixa até meados de Abril, talvez sucedânea do Mercado do Livro da Ribeira que acontece duas vezes por ano. Apesar do nome mais técnico (“manuseado” é incomparavelmente mais chique que o vulgarmente “usado” ou não estivéssemos na Rua Augusta), a maioria dos produtos expostos parecem-se mais com os livros que ninguém comprou do que com aqueles que se comprou e não gostou ou que se recebeu de herança duma tia qualquer e que á primeira vista é tudo lixo e só não é porque entretanto há alguém conhecido que diz conhecer alguém capaz de comprar aquilo por atacado.
Surpresa nesta feira foi encontrar dois livros (visivelmente mais degradados que manuseados) de Nietzche, tipo que não é nada comum encontrar por estas andanças. Encontrei também uma enciclopédia da prática sexual, profusamente ilustrada com fotografias (não tem bonecos a simular, tem pessoas mesmo) algumas das quais agradavelmente explicitas, duma nitidez estonteante e que não deixam a menor duvida sobre como fazer, principalmente como e onde agarrar e... Excelente para aprender ou recordar umas palavrinhas de latim.
Estive tentado a comprar um livro que encontrei do maestro António Vitorino de Almeida. Ele compôs aqui há largos anos (largos = muitos; muitos = ainda não devia ser eu nascido) um livro com uma capa preta chamado “Coca Cola Killer”, um relato infindável e insuportável mas cómico ao mesmo tempo (esta incongruência deixa-nos com uma sensação esquisitíssima atrás das orelhas que dura até não suportarmos mais aquele estilo de escrita e pura e simplesmente voltar a pôr o livro de lado) das aventuras dum tipo que era tipicamente qualquer coisa que acabei por esquecer e não é agora que me vou lembrar. Este livro que tive nas mãos (acho que o peguei com as duas mas não tenho a absoluta certeza) tinha no título salvo erro as palavras “herói” e “2000”, o que foi inexplicavelmente suficiente para não ser um ‘best-seller’. Salvo erro outra vez, o “Coca...” começava com um gajo a ver filmes pornográficos no Olimpia, e este começa com um gajo, que pelo que entendi será o mesmo, a cair nas águas nauseabundas de Veneza. Não comprei, mas já estive em Veneza (terá sido isto uma oportunidade que tive de dizer que já estive no sítio mais fotografado do mundo ?) e posso afiançar que é verdade o que no livro o Vitorino diz; que Veneza está infestada (este infestada é termo meu) de setas a indicar a praça de São Marcos ou a ponte Rialto.
Outra surpresa, um livro que encontrei de Lena D’Água, poemas, livro fininho. Li um bocadinho dum poema e olhei para a contracapa. Tinha lá a fotografia da autora ainda nova. Voltei a arrumá-lo cuidadosamente onde estavam os outros vinte ou trinta impecavelmente preservados nesta feira de livros usados.
Novas sugestões para nomes de feiras com livros, venham elas: Feira de Restos de Colecção, Feira do Livro Manejado, Feira do Livro Compulsado, Feira do Livro semi-novo, Mercado do Livro Rejeitado, Feira do Livro com Erro Tipográfico, Feira do Livro com algumas Páginas em Branco mas que não faz mal porque a malta compra mesmo é para ter na estante.
Novas entradas
Aleixar – Demonstrar de forma grosseira e ostensiva um sentimento carnal por outra pessoa; exteriorizar de maneira desbocada um estimulo sexual; agir com total ausência de romantismo, humor, cordialidade ou poesia para com alguém por quem se tem uma atracção física. (Ex: “Aquela gaja ali é mesmo muito boa sim senhor. Vou-me pôr a aleixar para ela, piscando-lhe os olhos e exibindo a minha longa língua, da qual me orgulho muito, e fazendo com ela movimentos insinuantes e lascivos, de forma a que a gaja não tenha a menor dúvida sobre quais são as minhas verdadeiras intenções, e que fique bem ciente de que no fundo o que sinto por ela é apenas pura atracção sexual despida de qualquer tipo de sentimento lamechas. Isto parece que não está a resultar... Mas que se lixe, o que há mais para aí é gajas para aleixar!” ou “Aquele c*br*o de merd* está-me só a aleixar! Há com cada tarado mais ordinário hoje em dia...”
Plocar – Defecar de forma saudável; termo utilizado por pessoas com corpos ou anûs elegantes. As pessoas que plocam são pessoas que se regem por uma alimentação saudável e racional. Logo não defecam, plocam.
(Ex: “Boa tarde, olhe se faz favor, era uma salada mediterrânica, um batido de manga, uma tosta e um iogurte natural... E olhe, vem rápido não vem ? É que depois tenho que ir plocar.” ou “Porra que está aqui uma tipa á rasca para arrear o calhau e a trinca espinhas que entrou ainda não parou de plocar! É que o ranchinho á moda de Viseu já me deu a volta á tripa! Só espero que haja papel higiénico nesta espelunca!”
Mijagreiro – Pessoa que faz milagres, vulgo mijagres com a própria urina. (Ex: “Pessoal, está um calor do caraças e não há dinheiro para sacar uma lata de Coca Cola da máquina. Mas não há problema. Faço já aqui um mijagre e mata-se já a sede á malta. Temos é que deixar arrefecer um bocadinho.” ou “Minha querida esposa, está por aí o nosso vizinho mijagreiro ? É que temos o carro a precisar duma lavagem e a água está sem pressão...”

sexta-feira, abril 04, 2003

Aspira-dor
Três mulheres, todas á volta dos trinta anos, começam a fazer sexo precisamente ao mesmo tempo (mais tarde uma diria á sua melhor amiga que não tinha sido sexo, tinha sido amor, o que deixou toda a gente perplexa) em três diferentes quartos do mesmo hotel. Uma com o marido, outra com o amante e a outra com o empregado da secção de perdidos e achados do aeroporto. Passada meia hora e não suportando o roncar dos homens, saem dos quartos e vão em roupão até ao ‘lobby’ do hotel que acaba de ser aspirado por uma empregada emigrante de cabo verde e que naquela noite tinha sido aliciada para efectuar a limpeza e aspiração do quarto 113 apenas vestida com um traje típico usado pelas nativas da sua terra, ou seja apenas com umas palhitas em cima do pêlo. As três mulheres sentam-se e começam a folhear as revistas deixadas ao acaso numa pequena mesa circular concebida para o efeito. Atiram com as revista janela fora quando se apercebem que as mesmas falam apenas da vida equina e começam a discutir sobre como se prenuncia o nome esquisito duma cadeia de lojas de perfumes que adquirira outra cadeia de lojas de perfumes mas com um nome normal. Enquanto isso um hospede que não consegue roncar mas gostava muito, espreita-as entre a frincha da porta do quarto 112 e apaixona-se pela mulher que tem o melhor sotaque e consegue pronunciar de maneira impecável o nome da cadeia de lojas de perfumaria. Não resistindo volta para dentro do quarto e dirige-se apressadamente para a casa de banho onde começa a ouvir o som do aspirador vindo do quarto do lado. Quando parece que o aspirador está com alguma dificuldade em aspirar, parece ter alguma coisa presa no cano, o homem decide declara-se á mulher cuja pronuncia não lhe sai da cabeça. Começa a vestir o seu melhor fato, corta as unhas dos pés e faz a barba tudo em simultâneo para poupar tempo. Entretanto as mulheres chegam á conclusão que naquele sitio não acontece nada de inesperado para além do irritante barulho dum aspirador misturado com o roncar que sai dos quartos, e que quem tem a melhor pronuncia é efectivamente a mulher de roupão de veludo vermelho e calcinhas a condizer. Então começam a achar que está demasiado calor e começam a despir-se. Isto demora uma hora. Depois despedem-se e dirigem-se as três para os respectivos quartos. Quando o homem que se pretendia declarar chega ao ‘lobby’, dá de caras com a empregada cabo-verdiana equipada com um aspirador e com menos meia dúzia de palhitas involuntariamente ou talvez insinuantemente aspiradas, que lhe vem pedir o dinheiro conforme combinado. O homem pergunta-lhe se ela aceita cheque, e ela diz que pode ser desde que seja visado.
Alberonice II
Há duas maneiras de uma mulher de saltos altos ser terrivelmente sensual: Se estiver nua ou prestes a estar, num quarto de hotel de luxo e se estivermos lá para ver a cena (uma mulher de luxo num quarto duma pensão barata também não fica nada mal desde que esteja também no limiar da nudez, de saltos altos e desde que necessariamente estejamos lá também preferencialmente semi-vestidos), ou se estiver vestida, logo não nua, na rua a correr rua a baixo (rua a cima, ou rua a direito, também resultará num espéctaculo inesquécivel, desde que ela passe por nós e ao contrário dela não venhamos com pressa).

quarta-feira, abril 02, 2003

"Já me deixei dessas coisas... Agora se tenho vontade de chorar, ponho-me a rir" - pode ser o ovo de colombo da psicoterapia ou um delirio prozacquiano. O caminho é feito todo assim, a rir, olhos azuis muito abertos, um constante esgar da felicidade atirado a um espelho que é a indiferença de todos. Não sei se esteve todo aquele tempo a chorar.
Estória de princípio de século para adormecer crianças até adormecerem
Quando estava a três metros da meta, o esqueleto Maurício tropeçou na sua tíbia direita e caiu na pista de “tartan”. O esqueleto rival, o Albertino, que era até então o segundo na corrida, quando ultrapassou o esqueleto caído, deu-lhe sem querer um pontapé na cabeça.
O esqueleto Albertino que agora cortava a meta vitorioso, erguia os ossos dos seus membros superiores num sinal de evidente satisfação, mal sabendo que a cabeça do seu adversário caído e que ele pontapeara sem querer, tinha rolado e atravessado o risco da meta em primeiro lugar.
Como mandavam as regras, numa corrida de 100 metros ganhava o esqueleto que com a cabeça, ou seja, com o crânio, passasse em primeiro lugar sobre a linha de meta.
Com a enorme satisfação que lhe percorria os 206 ossos de todo o seu esqueleto, o convencido vencedor Albertino era saudado por todos, sem que ninguém se apercebesse que os maxilares da cabeça caída do esqueleto Maurício se abriam e fechavam, balbuciando palavras vitoriosas e exigindo que o seu corpo esqueleto ainda caído, se levantasse e viesse até si.
Quando o esqueleto Maurício se recompôs, voltando á sua posição erecta e com a respectiva cabeça no sitio certo, dirigiu-se aos esqueletos árbitros para verificar o “photo-finish”, enquanto o esqueleto Albertino recebia os aplausos do esquelético público entusiasta.
Sim, não havia duvida! A cabeça do esqueleto Maurício que tinha tropeçado e caído, desprendera-se do resto dos ossos e atravessara a linha de meta primeiro que a cabeça do esqueleto Albertino que a tinha pontapeado, sem querer claro.
Pronto, estava lançada a polémica sobre as Olimpíadas dos Esqueletos Vaidosos.
Tudo foi decidido á cacetada, ou seja, à ossada, como mandavam as regras naqueles casos.
Como sempre, ganhou aquele que tinha mais resistência e força nos ossos. Aquele que tinha os ossos mais rijos. Aquele que tinha bebido mais leite e assim tomado mais cálcio. O vencedor acabaria por ser o esqueleto que tinha tropeçado e caído, o esqueleto Maurício.
Num gesto bonito, aquando da entrega das medalhas no “podium”, o esqueleto vencedor emprestou algumas das vértebras cervicais do seu pescoço ao esqueleto Albertino, o desclassificado do 1º lugar, para que este podesse receber condignamente a respectiva medalha de prata.

terça-feira, abril 01, 2003

Tolerância à guerra
Um dos perigos desta guerra, é o surgimento de um novo tipo de tolerância à guerra dita 'convencional'. Se antigamente os paises detentores de armas nucleares, quimicas e biológicas, à partida tinham na sua posse armas eminentemente dissuadoras de conflitos (veja-se o equilibrio que houve na guerra fria, onde as hostilidades não passavam dos gabinetes, ministérios e dos média), a partir de agora o equiliobrio do medo pode deixar de funcionar. Se o Saddam se comportar 'bem', se tiver armas de destruição maciça e não as utilizar, então poderá esta ser a primeira das guerras 'bem comportadas'. E no futuro, talvez a malta tenha permissão para se continuar a matar desde que sejam respeitadas as regras. Meia duzia de mortos hoje, outra duzia amanhã, o que será isso num universo de 400 mil homens... Uma guerra limpa está claro, longe dos verdadeiros horrores das guerras não convencionais, logo bem tolerada, facilmente ultrapassavel na vertigem dos proximos acontecimentos.

De volta ao Blogger

Depois de uma passagem pelo Weblog, o espécie volta ao Blogger.